Grupo de Política Internacional

03
Jun 09

A nova fase do projecto de integração europeia dos anos 1970 teve como peça fundamental a Alemanha Ocidental - país que constituía o centro do sub–sistema europeu do pós–Yalta -, nomeadamente a sua crescente afirmação externa através da Ostpolitik.

Não obstante ser possível identificar alguns sinais de mudança na estratégia externa da RFA num período anterior, foi a partir da ascensão de Willy Brandt a ministro dos Negócios Estrangeiros, primeiro, e a Chanceler, depois, que se assistiu à mudança fundamental operada pela Ostpolitik. Esta consistiu, grosso modo, na aposta numa normalização das relações da Alemanha Ocidental com a Europa de Leste enquanto veículo promotor de um desanuviamento das tensões no continente europeu o que, a prazo, podia facilitar a reunificação alemã. Deste modo, a anterior componente fulcral da política externa de Bona - «détente através de reunificação» - foi substituída por outra nova que inverteu a prioridade - «reunificação através da détente». (Timothy Garton Ash, 1994, p.54-55)

Para esta mudança muito contribuiu o contexto internacional do período, sobretudo a substituição da antiga rigidez da Guerra Fria por uma maior fluidez internacional característica da Détente. Mas também a acção directa de Brandt que decidiu inverter a equação diplomática do seu país e iniciar a abertura a Leste pela URSS, de quem dependia qualquer alteração de facto da realidade daquela região da Europa. Como referiu Wolfram Hanrieder, «(…)onde, no passado, Bona via como melhor perspectiva aproximar-se da Europa de Leste, primeiro, da URSS, segundo, e da RDA, terceiro, a seguir a Agosto de 1968 a URSS emergiu claramente como o parceiro de negociação absolutamente dominante». (Wolfram Hanrieder, 1989, p.192)

Na sequência desta nova estratégia, a 12 de Agosto de 1970, a RFA assinou com a URSS um pacto de não–agressão que constituiu o primeiro dos «quatro tratados fundamentais» estruturantes da Ostpolitik. Neste texto, Bona reconheceu «a inviolabilidade das fronteiras de todos os Estados Europeus (…) incluindo a fronteira Oder Neisse e com a RDA», sendo o último dado fundamental pois representou na prática o reconhecimento da Alemanha de Leste sob a fórmula «2 Estados, 1 Nação». Sintomaticamente, após a obtenção deste acordo assistiu-se a um “desanuviamento” da situação na Europa de Leste, com a assinatura do Pacto de não–agressão entre a RFA e a Polónia (Dezembro de 1970), o Acordo de Berlim (Setembro de 1971) e o Tratado Fundamental entre as duas Alemanhas (Dezembro de 1972).

A adopção desta nova orientação externa pela Alemanha Ocidental visou, num primeiro momento e numa dimensão de curto prazo, a aquisição de uma maior flexibilidade diplomática que ampliasse o espaço do país para adoptar iniciativas ao nível internacional. Como escreveu A. Deport: «(…)a República Federal da Alemanha evitou o isolamento com esta política externa; levantou o peso do passado alemão até ao ponto em que era capaz de o fazer; e, pela primeira vez, desenvolveu a confiança para adoptar iniciativas diplomáticas». (A.W.Deport, 1986, p.186). Já o objectivo de longo prazo foi o de potenciar as hipóteses da reunificação alemã através da atenuação das tensões europeias pois, sendo a Alemanha «o núcleo dividido da Europa dividida», a solução da divisão do país implicava a resolução, ou redução, da divisão da Europa. (Timothy Garton Ash, 1994, p.67)

Deste modo, os objectivos de Bona só podiam ser alcançados através de uma solução alargada da situação europeia, o que implicava não só uma abertura negocial por parte de Moscovo, mas igualmente a aceitação da Ostpolitik por parte dos aliados ocidentais que tendiam a suspeitar da cada vez maior independência diplomática da RFA. Procurando superar estas dificuldades, Brandt enquadrou a sua política numa estratégia mais geral que compreendeu dois pilares fundamentais: o desanuviamento Leste–Oeste, em especial no quadro da Conferência de Helsínquia, e o projecto de integração europeia.

De facto, a aposta no fortalecimento da construção europeia foi outro dos aspectos fundamentais da política externa da RFA deste período. Tratou-se desde logo de uma necessidade face à crescente desconfiança de EUA, França e Reino Unido em relação às intenções da Alemanha Ocidental no quadro da ordem europeia; porém, foi igualmente uma aposta estratégica de Bona pois, como George Kennan antecipou: «(…)se a Alemanha vier a ser unida, então ela tem de ser uma parte de algo maior do que ela própria. Uma Alemanha unida só pode ser tolerada como uma parte integral de uma Europa unida». (George Kennan, 1967, p.417)

publicado por Tiago Moreira de Sá às 10:18

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